sábado, 13 de outubro de 2012

A breve história da Pornochanchada

Por Marcelo Lopes

O que o trabalho de atores consagrados na televisão brasileira como Nuno Leal Maia, Vera Fischer, Antonio Fagundes, Reginaldo Faria e Sonia Braga têm em comum além de décadas de notoriedade e reconhecimento público? Pairam sobre eles o fato de terem sido astros no gênero mais popular das décadas de 1970/80, um estilo de filme que entrou para a história do cinema brasileiro com o nome de Pornochanchada.

Na história do nosso cinema este gênero foi responsável por um período de descrédito na produção nacional até o início dos anos 90, quando dedicar um tempo livre para ir ao cinema assistir a um filme brasileiro, segundo muitas pessoas, não valia o ingresso. Em termos chulos, filme nacional era sinônimo de putaria. Essa imagem de rejeição perdurou muito tempo, associando o que era produzido pelo cinema no país a um amontado de filmes de má qualidade.

A história da Pornochanchada se confunde com a lógica do pão-e-circo que funciona tão bem no Brasil. Na verdade, mais circo que pão. Assim como ocorre hoje com os programas de TV de imprensa marrom, com altos índices de audiência, os filmes deste gênero ganhavam a fidelidade do público dialogando com o que há de mais cru no instinto humano. Misturando elementos de linguagem fáceis, muita comédia, apelo excessivo ao sexo em realizações de baixa qualidade técnica, fracos roteiros em meio a um desfile de dezenas de mulheres nuas por película, estes filmes feitos para o puro entretenimento das massas eram, na verdade, o reflexo de um período que pretendia nos desobrigar do pensar crítico: a Ditadura Militar.

Boca do Lixo, São Paulo. Por Ozualdo Candeias.
Nesta época, o cinema era uma ferramenta de discurso, instrumento de revolução do qual se valiam muitos expoentes do pensamento artístico e político brasileiro, entre eles o baiano Glauber Rocha. Sem encontrar empecilhos com a censura – ao contrário de obras que impeliam o público a questionar a realidade de um país sob um regime totalitário – os filmes da pornochanchada eram estimulados a ocupar as grandes salas dos cinemas do Brasil. O sistema anual de quotas de exibição para filmes nacionais faziam com que o mecanismo, criado para incentivar a cultura brasileira, se tornasse um escoadouro do alto volume dos filmes baratos e rentáveis do gênero, cuja maior parte da produção vinha da Boca-do-Lixo paulistana, região conhecida por suas boates e bordéis. Eram filme independentes, quase sempre sem financiamento público, mas com um rentável mercado de venda e distribuição.

Xuxa e a famosa cena plolêmica com o menino de 12 anos
Os filmes de temática erótica levaram os atores e atrizes citados  para um estrelato meteórico, sem falar de autores como Silvio de Abreu, referência da qual muitos tentam apagar até hoje. Um caso emblemático é o da apresentadora Xuxa Meneghel, que ainda hoje tenta expurgar da memória cinematográfica brasileira as cópias do filme “Amor, Estranho Amor”(1979), do diretor Walter Hugo Khouri, um caso à parte na cinematografia do estilo, um diretor singular com obras realmente interessantes. Apesar de figurar entre as poucas realizações com melhor tratamento de produção e texto do gênero, o filme ainda hoje persegue a biografia da Rainha dos Baixinhos e se tornou Cult e kitsch no raking de filmes baixados na internet. Outros nomes “enobrecidos” pela pornochancada, mas hoje esquecidos, como David Cardoso, considerado o arquétipo do “macho brasileiro”, eram garantia de bilheteria por semanas nos cinemas. 

Cena de "Bonitinha, mas Ordinária", com Lucélia Santos
Segundo a historiadora Cristiane Nova, ao contrário dos filmes do Cinema Novo que encontravam dificuldades em acessar o público por sua linguagem complexa, os filmes da pornochanchada falavam ao público de forma direta e sua rentabilidade era visível em contraponto aos filmes dos cineastas cinemanovistas: uma ironia, já que o conteúdo dos filmes politizados eram feitos para se dirigir diretamente ao povo. Somado a isso, o processo de franca expansão econômica do país nas décadas que aninharam o gênero eram muito mais bem-vindo nos esquemas industriais da Boca do Lixo que na lógica de contestação do Cinema Novo.

A pornochanchada fez bilheterias memoráveis, povoando o imaginário de milhares de pessoas no Brasil, com uma evidente contribuição para o aumento das espinhas de muitas gerações de adolescentes. São exemplos destes, os filmes Mulher Objeto e A Árvore dos Sexos, de Silvio de Abreu, Giselle, Bem Dotado, o Homem de Itu, Histórias que Nossas Babás não Contavam, Como É Boa Nossa Empregada, As Cangaceiras Eróticas, As Intimidades de Analu e Fernanda e O Convite ao Prazer.

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