domingo, 7 de agosto de 2011

O Genial mestre didático do Cinema Mundial

Você sabe a diferença entre um filme de mistério e um filme de suspense?

Considere a seguinte cena: um ônibus sai da garagem da sua empresa por volta das 6h30 da manhã. O motorista segue para o primeiro ponto e apanha alguns passageiros. Entram dois estudantes adolescentes, uma senhora idosa, uma mulher gorda puxando pela mão um menino que carrega uma mochila. Estes últimos sentam-se numa das poltronas do início do veículo, mas, desconfortáveis, mudam-se para a parte de trás do ônibus. O motorista dirige para mais dois pontos apanhando passageiros, e no segundo, um homem de paletó olha para o relógio, apalpa o bolso, faz sinal de que esqueceu algo importante, se vira e deixa o ônibus passar. O veículo segue e pára em frente ao sinal fechado. O relógio da rua marca sete horas em ponto. Sincronicamente ao abrir do sinal, o ônibus explode.

Como e por que razões este fato culminante ocorre é a questão chave da cena que definimos como misteriosa.
Agora pensemos a mesma cena sobre um ângulo diferente: às três horas da madrugada, um homem vestido de preto salta o muro de uma empresa de transporte urbano. Dirige-se para a garagem e prende sob o assoalho de um dos ônibus, um pacote cheio de fios onde um teclado é acionado, cravando em dígitos vermelhos o horário das sete horas. Pela manhã o mesmo ônibus sai e vemos o percurso que este faz apanhando seus passageiros. Um a um todos entram e se acomodam. Contamos cada novo passageiro, sabendo o que os espera. Vemos ainda que a senhora gorda e a criança acomodam-se na exata poltrona acima de onde foi escondida a bomba, mas logo em seguida, para alívio de quem assiste, muda de lugar. Vemos mais passageiros entrarem e o homem que, por um átimo de sorte, esquece algo e resolve não subir na condução. Depois só a explosão.
A mesma história, o mesmo fim, expectativas diferentes. Expectativas estas que moldam a diferença entre o gênero de mistério e suspense. No cinema mundial, o maior expoente da narrativa de suspense entrou para a posteridade com um estilo inconfundível, uma técnica impecável, que inspirou e formou dezenas de outros grandes diretores depois dele e mudou a relação do filme com seu público: com vocês, Sir Alfred Hitchcock.
Barrigudo. Muito longe de ser bonito. Careca. Beiçudo. Quase sempre de cara feia. E mesmo assim adorado em toda Hollywood e na filmografia mundial. Este belo espécime das películas é um dos gênios mais consagrados do cinema de todos os tempos pela capacidade inquietante e didática de narrar histórias. Ficou conhecido (para a além da sua clássica silhueta em perfil) como o Mestre do Suspense. Sua filmografia data dos tempos do cinema mudo e segue para depois da revolução do som e da cor nas salas de exibição.
O diretor inglês Alfred Hitchcock fez de sua obra uma constante homenagem ao público de cinema. Manipulava os sentimentos da plateia, conduzia-os aonde queria, ditava o tempo em que respiração devia-se manter suspensa, comandava os sustos e o medo de cada um como um maestro faz com sua orquestra. Foi o responsável por uma filmografia repleta de simbologias, simetrias, sem excessos de quaisquer tipos (personagens, texto, sons, cenários), dando uma aula a cada nova obra de como contar uma história em filme. Definiu o estilo de pirâmide invertida para apresentar suas narrativas, do geral para o específico, do maior cenário ao menor detalhe, compondo um elenco de informações enxutas em que nos conta, com absoluta didática, quem são os personagens e suas características principais, quando e onde ocorrem o enredo e a trama principal. Tudo isso apenas nos primeiros minutos de exibição. Sua vasta obra, sua maneira didática (e quase esquemática) foi matéria prima de histórias que trilhavam lógicas e cenários que só existiam para garantir o início, meio e fim no universo de sua própria narrativa.
Uma das cenas mais clássicas da história do cinema, no filme Janela Indiscreta (Rear Window, 1954), Hitchcock mostra a reação emocional do público na sala de cinema na figura do personagem vivido pelo ator James Stewart: o fotógrafo bisbilhoteiro Jeffrey cisma que um de seus vizinhos (ao qual espionava há dias pela janela do seu apartamento) poderia ter matado a esposa e acaba por deixar que sua namorada (a linda Grace Kelly) invada a residência do suspeito em busca de provas. Durante a invasão, Jeffrey assiste pela ampla janela de seu próprio apartamento, impotente, a chegada inesperada do suspeito na casa sem poder avisar ou interferir no enredo à sua frente. Como num cinema.
Hitchcock ainda foi diretor de filmes emblemáticos como Festim Diabólico (Rope, 1948), Um Corpo que Cai (Vertigo, 1958), Psicose (Psycho, 1960), Os Pássaros (The Birds, 1963) e muitos outros que puseram para sempre sua silhueta nas telas do cinema mundial.
Para quem gosta de cinema e quer aprender como se faz um filme, assistir a seus filmes é um exercício (prazerosamente) obrigatório.

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